Qual é o futuro do seguro rural no Brasil diante das mudanças climáticas?
- 08/09/2025
Com os impactos das mudanças climáticas cada vez mais evidentes no campo, o seguro rural assume um papel estratégico fundamental na transição climática do Brasil. Muito além de ser um simples meio de indenização por perdas, ele se consolida como uma poderosa ferramenta para a adaptação e resiliência do agronegócio diante dos riscos climáticos cada vez mais frequentes e intensos. Entretanto, apesar do reconhecimento crescente, o setor ainda convive com desafios estruturais, que limitam sua capacidade de ampliar cobertura, melhorar a qualidade da informação e inovar os produtos e serviços ofertados.
Elisa Rodrigues, conselheira consultiva da “Diversity on Boards” e integrante da “Sou Segura” — movimento que valoriza o protagonismo feminino no mercado de seguros — é uma voz referência nesse cenário. Filha de produtor rural e com ampla experiência no setor corporativo de seguros, ela reforça que o seguro rural, frequentemente encarado como um custo, deve ser ressignificado como proteção patrimonial essencial. “Com os preços dos insumos nas alturas e a instabilidade climática crescente, investir no seguro é evitar perdas desastrosas. Ele não gera lucro, mas protege contra prejuízos severos que podem comprometem o negócio,” destaca. Ela enfatiza que o agronegócio responde por quase 27% do PIB brasileiro e é o maior empregador do país, o que torna o fortalecimento do seguro rural uma questão estratégica para a continuidade e o desenvolvimento da economia nacional.

A especialista defende, ainda, que o seguro rural deve fazer parte do planejamento estratégico das propriedades, o que exige conhecimento técnico aprofundado. “Quem subscreve precisa ir a campo, conhecer a lavoura, entender o manejo. Vender seguro por telefone ou WhatsApp é muito distante da realidade e das necessidades do setor,” explica. Ela destaca o papel das cooperativas agrícolas na difusão de modelos inovadores como o seguro paramétrico, vinculado a indicadores climáticos e meteorológicos, que tem sido muito útil em regiões com histórico de perdas por eventos climáticos adversos. “Esse formato é simples, transparente e eficaz, especialmente onde os riscos naturais são mais frequentes.”
No entanto, o avanço do seguro rural esbarra em grandes obstáculos. A baixa educação securitária e a desinformação dificultam uma contratação correta e informada, o que gera desconfiança no mercado. Elisa ressalta que “quando o produtor contrata um seguro e não recebe indenização, a desconfiança se espalha. Muitas vezes, o problema está na escolha inadequada do produto ou na falta de acompanhamento técnico. É crucial aproximar produtor e seguradora.” A insuficiência da subvenção pública também limita o acesso de pequenos e médios agricultores, enquanto os grandes produtores contam com consultores dedicados. “O acesso ao crédito e subvenção precisa ser mais democrático para alcançar todo o agronegócio,” defende.
Dados recentes da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) revelam uma queda preocupante na área segurada: de 14 milhões de hectares em 2023 para 7 milhões em 2024, estimando-se que o número possa cair para menos de 5 milhões em 2025. Isso representa apenas 6,11% da safra nacional de grãos, que abrange 81,8 milhões de hectares, evidenciando o impacto direto do congelamento de R$ 445 milhões no orçamento do Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) para 2025, quase metade do valor destinado no exercício anterior.
Outro desafio está na comunicação. O jargão técnico presente nas apólices muitas vezes torna o seguro inacessível para o produtor rural médio. “Produtos tecnicamente avançados perdem valor se o cliente não compreende o que está contratando. Precisamos traduzir o seguro para a língua do campo,” pontua Elisa, sublinhando a necessidade de comunicação clara e eficaz.
Tecnologia é aliada
Nesse contexto, a tecnologia surge como uma grande aliada da transformação. Ferramentas como monitoramento remoto, sensoriamento climático, imagens de satélite e sensores de umidade do solo têm sido adotadas para reduzir custos, ampliar o alcance dos seguros e fortalecer a confiança dos produtores. Elisa cita casos concretos, como sensores com gel retardante para evitar incêndios em máquinas agrícolas e torres meteorológicas que alertam sobre umidade e chuvas iminentes. “Essas soluções não são caras e ajudam o produtor a gerenciar riscos com mais precisão,” pontua. Instituições como a Embrapa, cooperativas e o Sistema Senar contribuem decisivamente com suporte técnico e capacitação, enquanto algumas cooperativas assumem até metade do custo do seguro para facilitar o acesso.
O aumento global do interesse em créditos de carbono e economia verde abre uma janela de oportunidade para a chegada de fundos climáticos internacionais ao setor, potencializando a expansão do seguro rural no país. Entretanto, Elisa Rodrigues alerta para a necessidade de alinhamento com as reais necessidades e expertise locais, destacando que o sucesso depende do conhecimento do campo e da gestão ética dos riscos. “Investimentos estrangeiros precisam respeitar a realidade do Brasil para que, de fato, fortaleçam a agricultura com sustentabilidade e segurança,” enfatiza.
Nesse cenário, a COP30, que acontecerá em Belém, coloca o Brasil no epicentro das discussões internacionais sobre clima e sustentabilidade. A “Casa do Seguro”, iniciativa da CNseg, será palco para debater o seguro rural como instrumento não só financeiro, mas social, focado especialmente em pequenos e médios produtores. “Minha mensagem para a COP30 é clara: conheça o campo, administre o risco com dados precisos e esteja presente onde a produção acontece. Seguro rural não se vende remotamente, mas no chão da lavoura,” conclui Elisa Rodrigues.
O momento exige esforços conjuntos do setor público, privado e da sociedade para garantir a expansão do seguro rural, promovendo maior resiliência, segurança e sustentabilidade para um dos pilares da economia brasileira: o agronegócio.
Sobre a Casa do Seguro
A Casa do Seguro estará situada em local muito próximo ao espaço oficial da COP30. Além da programação de conteúdo, promoverá iniciativas de responsabilidade social, prestigiando a economia e a mão de obra locais. O projeto é ambientalmente responsável e foi desenvolvido dentro dos conceitos de evento neutro e resíduo zero, prevendo ainda uso eficiente de água e energia.
Com o apoio de seus empoderadores – Allianz, AXA, Bradesco Seguros, MAPFRE, Marsh, Porto, Prudential, Tokio Marine and Marsh McLennann – a Casa funcionará em 1,6 mil m² de área útil, acomodando plenária com 100 lugares, seis salas de reunião, business lounges, estúdio para gravação de podcasts, sala de imprensa, espaço de convivência e área para exposições artísticas e apresentações culturais.
Na programação, destacam-se:
- debates e painéis temáticos;
- fóruns em parceria com entidades setoriais, organizações internacionais e contrapartes estrangeiras da CNseg;
- reuniões bilaterais;
- apresentação de produtos e serviços; e
- atividades culturais.
Alguns eixos vão pautar a agenda da Casa do Seguro, como a proteção social e dos investimentos, as finanças sustentáveis, a infraestrutura resiliente, a inteligência climática, seguros & agronegócio, a descarbonização da frota brasileira e como os seguros podem auxiliar no desenvolvimento industrial mais sustentável.